Estudantes da UnB criam software gratuito para a alfabetização de pessoas com deficiência intelectual
Antônio Filho
Crédito da foto: Michael Melo/Veja
Configuração primária, poucas cores e vídeos em baixa definição. A julgar apenas pela aparência, o programa de computador Participar, criado por estudantes da Universidade de Brasília (UnB), poderia ser considerado uma ferramenta ultrapassada. Porém, essa plataforma educacional, simples do jeito que é, tem sido de grande valia para ajudar na resolução de um problema complexo. Fotos, filmes autoexplicativos e simulador de bate-papo auxiliam jovens e adultos com deficiência intelectual a se comunicar com o mundo.
Para fazer o download no site do projeto, clique aqui.
Testado durante dois anos em 650 centros de ensino do Distrito Federal e em unidades da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), o software teve aprovação geral. Seu resultado mostrou-se tão satisfatório que o Ministério da Educação decidiu levar o projeto para 93.000 escolas públicas do país a partir do próximo mês. Junto de outro aplicativo, batizado de Somar (veja abaixo), ele forma a única dupla de tecnologia do gênero que atende às necessidades educacionais desse público-alvo no Brasil.
Um dos inúmeros beneficiados com o uso do Participar foi Antônio Filho, mais conhecido como Tonico, de 34 anos, que tem síndrome de Down. Ele passava a maior parte do tempo pintando quadros, que chegam a ser vendidos por 1 500 reais. Ao descobrir o software, melhorou sua capacidade de comunicação e ampliou os contatos. “Após a experiência com o aplicativo, Tonico começou a se sociabilizar mais”, afirma a mãe, Maria Margarida Araújo.
Além de lhe dar suporte na alfabetização, a plataforma incentivou-o a se aventurar nas redes sociais. “Agora uso o Facebook para conversar com as pessoas”, diz ele, que, inclusive, já iniciou um namoro graças à novidade. A estudante Karina Valença, de 20 anos, que nasceu com esta mesma síndrome, também apresenta evolução no processo de socialização. “A plataforma incentivou minha filha a aprender novas palavras”, afirma Amauri Valença, pai da jovem.
O software que está mudando a vida de muita gente surgiu a partir de uma conversa entre Wilson Veneziano, professor e coordenador de ciência da computação na UnB, e a pedagoga Maraísa Estevão, que trabalha na área educacional há mais de vinte anos. Quando veio a ideia de desenvolver um programa, ambos concordaram que ele deveria trazer imagens do cotidiano. “Assim tornamos a realidade de deficientes mais próxima do nosso dia a dia”, conta Maraísa.
Após acertar detalhes sobre a concepção da plataforma, Veneziano ofereceu o projeto a uma turma do último ano da graduação. Assim, os estudantes Renato Domingues e Tiago Galvão ajudaram a pôr em prática o Participar, cujos vídeos são protagonizados por duas pessoas com síndrome de Down — uma delas é o pintor Tonico. A opção visava a estimular a participação de pessoas com deficiência intelectual. “O resultado mostrou-se tão eficiente que houve até casos de mães que deixaram os filhos em lan houses usando o programa enquanto saíam para trabalhar”, conta Veneziano.
Mesmo com o retorno positivo, foi necessário aprimorar alguns pontos no software para torná-lo mais atraente. Entrou em cena, então, o estudante João Paulo de Andrade. Entre as novidades, ele acrescentou exercícios sobre regras de acentuação e pontuação. Essa segunda versão é a que será distribuída para todo o Brasil, notícia que encheu de orgulho quem participou do desenvolvimento do aplicativo. “Fiquei surpreso. Não esperava que o projeto tomasse tal proporção”, confessa Andrade. A plataforma pode ser baixada gratuitamente no site www.projetoparticipar.unb.br. Trata-se de um ótimo exemplo de como uma tecnologia que é fruto da iniciativa de poucos, e com baixo custo, pode ser decisiva para ampliar as oportunidades de um vasto leque social.
Algo a acrescentar
Enquanto o Participar trabalha a alfabetização de pessoas com deficiência intelectual, outro programa – também criado por alunos da UNB – reforça a integração social deste público. Trata-se da plataforma Somar, que propõe exercícios matemáticos comuns do dia a dia. Aprender a ver as horas em relógio digital, fazer compre em mercados e pagar a passagem do ônibus, sempre de olho no troco gerado pela transação, estão entre as atividades oferecidas pelo software. Criado pelos estudantes Lucas Santiago e Thiago Moreira, o programa será disponibilizado a partir de março deste ano no mesmo endereço virtual do Participar. O projeto também deve ser distribuído pelo Ministério da Educação para as escolas públicas de todo o país.
Fonte: Veja
Postado por Maria Célia Becattini
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