O esporte mais popular do planeta pode ser a ponte para a aprendizagem de valores humanos e até da matemática
Foto: Maurício Mel
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"O futebol será pedagógico e educativo se forem criados ambientes de aprendizagem"
No começo de sua carreira como professor de Educação Física, na década de 1990, Alcides José Scaglia deu início a um trabalho que o marcaria para sempre. Na escola onde lecionava em Paulínia, a Escola Municipal Oadil Pietrobon, não havia uma quadra esportiva, motivo de queixa dos alunos. Tinha, no entanto, uma área gramada não aproveitada. Influenciado pelos pensamentos do pedagogo Celestin Freinet, que, entre muitas outras ideias, defendia a aprendizagem por meio da experiência, Alcides mobilizou alunos e professores na construção de um campo de futebol no espaço ocioso.
Para projetar o "estádio" o time ganhou o reforço da professora Márcia, de matemática. Em suas aulas, retângulos, círculos e semicírculos passaram a ser vistos por outra perspectiva pelos alunos da quarta série do antigo ensino fundamental - hoje quinto ano. De compassos e réguas nasceram a pequena e a grande área, a meia lua, as linhas de fundo e laterais e os gols. Também coube à classe, dividida em grupos, a avaliação do terreno - as informações eram levadas aos projetistas -, fazer o orçamento da obra, preparar um ofício para a diretora e selecionar no bambuzal, no fundo da escola, os melhores pedaços que seriam serrados pelo zelador e transformados nas traves dos gols.
O planejamento, tocado em paralelo com o conteúdo regular das aulas, levou um mês e meio para ficar pronto; o campinho apenas um dia. As crianças, orientadas pelos professores, transpuseram a planta para a escala real, calculando os espaços do campo com barbantes, desenharam as linhas com cal e fixaram na grama as traves. O jogo de estreia, tamanha a ansiedade, se deu logo ao fim do expediente. E o projeto não terminou ali.
No dia seguinte, os alunos do quinto ano explicaram aos demais que o patrimônio era de todos e combinaram horários e regras para sua utilização nos intervalos. Depois da experiência, os professores perceberam uma melhora no desenvolvimento de suas matérias. Nas aulas de Márcia, a compreensão da aritmética e de formas geométricas ficara mais fácil; nas de Alcides, a parte conceitual dos jogos com bola também. "O esporte, em geral, será o que fizermos dele. O futebol será pedagógico e educativo se forem criados ambientes de aprendizagem, de modo a possibilitar que realmente se atinjam os objetivos educativos que se pretende", diz o professor, hoje coordenador do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.
Veja abaixo outras lições que podem vir do futebol:
No começo de sua carreira como professor de Educação Física, na década de 1990, Alcides José Scaglia deu início a um trabalho que o marcaria para sempre. Na escola onde lecionava em Paulínia, a Escola Municipal Oadil Pietrobon, não havia uma quadra esportiva, motivo de queixa dos alunos. Tinha, no entanto, uma área gramada não aproveitada. Influenciado pelos pensamentos do pedagogo Celestin Freinet, que, entre muitas outras ideias, defendia a aprendizagem por meio da experiência, Alcides mobilizou alunos e professores na construção de um campo de futebol no espaço ocioso.
Para projetar o "estádio" o time ganhou o reforço da professora Márcia, de matemática. Em suas aulas, retângulos, círculos e semicírculos passaram a ser vistos por outra perspectiva pelos alunos da quarta série do antigo ensino fundamental - hoje quinto ano. De compassos e réguas nasceram a pequena e a grande área, a meia lua, as linhas de fundo e laterais e os gols. Também coube à classe, dividida em grupos, a avaliação do terreno - as informações eram levadas aos projetistas -, fazer o orçamento da obra, preparar um ofício para a diretora e selecionar no bambuzal, no fundo da escola, os melhores pedaços que seriam serrados pelo zelador e transformados nas traves dos gols.
O planejamento, tocado em paralelo com o conteúdo regular das aulas, levou um mês e meio para ficar pronto; o campinho apenas um dia. As crianças, orientadas pelos professores, transpuseram a planta para a escala real, calculando os espaços do campo com barbantes, desenharam as linhas com cal e fixaram na grama as traves. O jogo de estreia, tamanha a ansiedade, se deu logo ao fim do expediente. E o projeto não terminou ali.
No dia seguinte, os alunos do quinto ano explicaram aos demais que o patrimônio era de todos e combinaram horários e regras para sua utilização nos intervalos. Depois da experiência, os professores perceberam uma melhora no desenvolvimento de suas matérias. Nas aulas de Márcia, a compreensão da aritmética e de formas geométricas ficara mais fácil; nas de Alcides, a parte conceitual dos jogos com bola também. "O esporte, em geral, será o que fizermos dele. O futebol será pedagógico e educativo se forem criados ambientes de aprendizagem, de modo a possibilitar que realmente se atinjam os objetivos educativos que se pretende", diz o professor, hoje coordenador do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.
Veja abaixo outras lições que podem vir do futebol:
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É até óbvio, mas não deixa de ser importante: futebol, assim como a vida, é um jogo coletivo, não dá pra ser fominha. "Sempre num time de futebol você tem um cara mais habilidoso, outro que corre mais, mas ninguém ganha sozinho. Tem de ter espírito de equipe", explica Fernando Godoy, diretor da sucursal brasileira da ONG Spirit of Football. Nas aulas de futebol, as crianças percebem que quando todo mundo trabalha em conjunto por um objetivo comum é mais fácil alcançar o sucesso. Elas percebem também que cooperar é melhor do que se impor sobre os outros.
2. Jogar limpoEm um jogo de futebol profissional, se o time "A" conduz a bola rumo ao ataque e um jogador do time adversário se encontra no chão, o atacante costuma tocar a bola para fora do campo. Feito o atendimento, o time "B" devolve ao time "A" a posse de bola. Um exemplo clássico de "Fair Play", ou, jogo limpo, ensinado desde cedo nas (boas) aulas de futebol. "A gente procura mostrar que você tem é um adversário e não um inimigo", diz Fábio Oliani, professor e coordenador de educação física do colégio São Luís.
3. Ter noções de regras, moralidade e autonomia
Fez falta, perde a bola. Xingou o adversário, leva cartão. Todas as atitudes antidesportivas têm uma consequência. A criança aprende que precisa respeitar as regras para se manter em campo. "Não existe jogo sem regra e quem joga verdadeiramente jura respeito às regras, violá-las traz consequências imediatas às relações sociais desenvolvidas no jogo", diz Alcides José Scaglia, coordenador do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp. Alcides vai além e afirma que os alunos devem ser encorajados a criar as próprias regras, que nunca devem ser impostas. Dessa maneira, passam a refletir sobre as mesmas, questioná-las e a se tornarem mais autônomos.
4. Raciocinar rápido, com noção espacial e concentração
4. Raciocinar rápido, com noção espacial e concentração
Os fundamentos do futebol e de brincadeiras de bola no pé trabalham o tempo todo, de maneira natural, com essas três habilidades essenciais. "O futebol ajuda muito na resolução de problemas. Quando vai driblar um adversário, o jogador precisa pensar rápido; para fazer a marcação do atacante é preciso concentração; para chutar ou fazer um passe, senso de direção e noção do espaço", diz Fábio Oliani, professor e coordenador de educação física do colégio São Luís.
5. Ter pensamento crítico
O professor de educação física ou treinador de uma escolinha de futebol pode trabalhar assuntos conceituais que fazem parte do universo do futebol. "Há uma relação intrínseca entre futebol e cultura. Os professores podem alertar sobre as mazelas na cultura popular do futebol, que vão desde sua origem junto ao início da construção do sistema capitalista, o que evidencia muitos problemas, até as inocentes brincadeiras entre torcedores rivais, que se inicia no interior das famílias. E criar condições para a reflexão e ação", afirma Alcides José Scaglia, coordenador do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.
6. Criar hábitos saudáveis e melhora da saúde como um todoO professor de educação física ou treinador de uma escolinha de futebol pode trabalhar assuntos conceituais que fazem parte do universo do futebol. "Há uma relação intrínseca entre futebol e cultura. Os professores podem alertar sobre as mazelas na cultura popular do futebol, que vão desde sua origem junto ao início da construção do sistema capitalista, o que evidencia muitos problemas, até as inocentes brincadeiras entre torcedores rivais, que se inicia no interior das famílias. E criar condições para a reflexão e ação", afirma Alcides José Scaglia, coordenador do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.
"Se o esporte é pratico e aprendido imerso em um ambiente de prazer pela aprendizagem, alegria por saber ganhar e perder (que faz parte da aprendizagem do jogo) e acolhimento pelo sentimento de pertencimento, o jovem praticante levará isto para o resto de sua vida, o que em ganhos para a saúde (não apenas física) é fenomenal", afirma Alcides José Scaglia, coordenador do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.
7. Aprender com as derrotas
Perder faz parte do jogo - e da vida. Ao reavaliar uma derrota com o professor, a criança reflete sobre o que pode fazer para melhorar seu desempenho. Isso é importante para que ela perceba o valor do esforço para cada conquista.
8. Respeitar o outro
No esporte, a criança aprende a ganhar sem desprezar o valor do adversário. Pequenos gestos como ouvir o hino do outro time, apertar a mão ao fim do jogo, trocar a camisa com outro jogador mostram que a disputa se restringe ao campo.
9. Ter mais compromisso
Quando a criança defende a camisa de um time, ela se compromete a comparecer nos treinos, a dormir cedo para ficar descansada, a ter uma alimentação saudável... Ela se sente responsável pelo seu desempenho frente ao time.
10. Acreditar que o esforço recompensaQuando a criança defende a camisa de um time, ela se compromete a comparecer nos treinos, a dormir cedo para ficar descansada, a ter uma alimentação saudável... Ela se sente responsável pelo seu desempenho frente ao time.
11. Controlar as emoções
Mesmo um atleta habilidoso pode se atrapalhar se não conseguir controlar o nervosismo durante o jogo. A cabeça fria é importante tanto na hora de cobrar um pênalti quanto na hora de não agredir o adversário provocando uma expulsão.
Mesmo um atleta habilidoso pode se atrapalhar se não conseguir controlar o nervosismo durante o jogo. A cabeça fria é importante tanto na hora de cobrar um pênalti quanto na hora de não agredir o adversário provocando uma expulsão.
12. Melhorar a sociabilidade
Para viver em sociedade, precisamos aprender a nos expressar, sem nos impor sobre o outro, mas também sem deixar que ele nos oprima. Assim também é no esporte: um jogador precisa ter coragem de ousar, de colocar para fora suas potencialidades, de exercer sem inibição suas habilidades.
Para viver em sociedade, precisamos aprender a nos expressar, sem nos impor sobre o outro, mas também sem deixar que ele nos oprima. Assim também é no esporte: um jogador precisa ter coragem de ousar, de colocar para fora suas potencialidades, de exercer sem inibição suas habilidades.
O esporte é um ótimo ambiente para mostrar às crianças o peso de suas escolhas. Ir ao treino ou ao cinema? Passar a bola ou seguir em frente? Não dá para jogar sempre a culpa das derrotas nas circunstâncias, no azar, na vida, no outro. A criança vai aprendendo que o resultado do jogo é fruto de suas atitudes.
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