Postado por Maria Célia Becattini
- O termo esquizofrenia (esquizo = cisão, frenia = mente) foi introduzido em 1911 pelo psiquiatra suíço Eugen Bleuler para definir uma doença psíquica caracterizada, basicamente, pela "cisão do pensamento, do afeto, da vontade e do sentimento subjetivo da personalidade". Os sintomas da esquizofrenia são classificados em sintomas produtivos e sintomas negativos. Os sintomas produtivos mais característicos são o delírio e as alucinações.
Entende-se por delírio um juízo falso e irredutível da realidade, como por exemplo um delírio de perseguição (delírio paranóide), no qual o paciente sente-se perseguido e ameaçado por outras pessoas, interpretando fatos da vida quotidiana como provas cabais de sua perseguição. Alucinações são percepções sem estímulo externo, como por exemplo ver ou ouvir coisas não presentes. Na esquizofrenia as alucinações auditivas são as mais freqüentes: o paciente escuta vozes de pessoas ausentes, comentando sobre seu comportamento ou dando-lhe ordens imperativas, às quais ele não consegue resistir. O paciente passa a sentir-se influenciado por outros, perde o controle de sua própria vontade, sente-se controlado por telepatia, por hipnose, "como um robô". Pode também interpretar delirantemente estímulos reais, como por exemplo achar que uma determinada notícia na televisão ou no rádio refere-se à sua pessoa. Os sintomas negativos caracterizam-se, principalmente, por uma diminuição da ressonância afetiva e por um empobrecimento do conteúdo do pensamento.
Na população geral, o risco de um indivíduo de adoecer de uma esquizofrenia durante a vida é de 1%, a prevalência da doença (freqüência em determinado ponto no tempo) é de 0,5% e a incidência é de 30 novos adoecimentos em cada 100.000 habitantes por ano. A idade média de início da esquizofrenia é de 20 a 25 anos nos homens e de 25 a 30 anos nas mulheres. Os sintomas iniciais são uma irritabilidade generalizada, um estreitamento dos interesses, morosidade, indecisão, isolamento social e descuido do aspecto pessoal.
De uma maneira geral, sabe-se que após o primeiro surto esquizofrênico 1/3 dos pacientes nunca mais adoece, 1/3 volta a ter outros surtos com intervalos sadios, e apenas 1/3 tem um curso desfavorável, desenvolvendo uma sintomatologia residual (comportamento excêntrico, diminuição do afeto e da vontade, autismo com perda de contato com o mundo circundante). Diversos estudos mostram que 50% dos esquizofrênicos são hospitalizados apenas uma vez, e que em 60% dos casos, com um tratamento adequado, consegue-se uma reintegração social e profissional satisfatória. Mesmo nos casos de curso desfavorável, a gravidade dos sintomas evolui dentro dos primeiros 5 anos da doença, não havendo piora após este intervalo. Com isto, sabe-se hoje que o prognóstico da esquizofrenia não é tão catastrófico como se acreditava há algumas décadas.
As causas da esquizofrenia ainda não foram totalmente elucidadas. Supomos tratar-se não de uma doença única, mas de uma síndrome com diferentes etiologias. Sabe-se que um fator genético tem um papel importante, visto que em gêmeos monozigóticos, quando um sofre da esquizofrenia, o outro terá um risco de 50% de adoecer, comparado com 1% na população geral. Entretanto, o fato de que o risco de concordância para a doença nestes indivíduos geneticamente idênticos ser bem abaixo dos 100% prova que outros fatores, não genéticos, também tem que estar operantes.
Um número grande de estudos mostra que a esquizofrenia esta associada com uma disfunção cerebral, principalmente do lobo frontal. Como esta disfunção já está presente em pacientes jovens, no primeiro surto da doença, supomos que ela não seja conseqüência da psicose em si ou de seu tratamento, mas sim que resulte de um distúrbio na maturação do cérebro durante a infância e a adolescência. Assim, fatores metabólicos ou ambientais que influenciem este processo de maturação poderiam contribuir facilitando ou protegendo o desencadeamento da doença.
Concluindo, sabemos que a esquizofrenia é uma doença universal, ocorrendo em todos os povos e culturas com incidência semelhante. Aqui, as mulheres parecem ter uma vantagem sobre os homens, visto que elas apresentam um adoecimento mais tardio e um curso mais favorável. Diversos experimentos sugerem que os hormônios sexuais femininos (estrógenos) poderiam contribuir para esta vantagem. O desenvolvimento recente de novos medicamentos antipsicóticos mais eficazes e com menos efeitos colaterais, adicionados à introdução de novas estratégias de reabilitação, causaram um grande impacto no tratamento e no prognóstico da esquizofrenia, permitindo um tempo de hospitalização mais curto e beneficiando uma maior reintegração social e profissional de nossos pacientes. (Autor: Prof. Dr. Wagner F. Gattaz
Prof. Titular do Dep. Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP)
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